Precisamos falar sobre... Ética!

10 março C. Vieira 0 Comments

Há muito tempo, eu percebi o quanto seria importante este tema em minha vida. A ética é intrínseca a uma existência saudável, não apenas para si mesma mas também para as pessoas ao nosso redor.

E sinceramente, eu acredito que, desde a tenra idade, deveríamos ter contato com os estudos relacionados a ética. Porque ética é a liberdade de sermos quem somos, de agirmos com consciência (ética) acerca do que é bom e do que é mau, mas também de aceitar que outrem o sejam e o façam. Ainda que não seja exatamente como eu quero mas que esteja eticamente norteado para o Bem. Ou seja, pressupõe respeito pois nos leva a escolher sempre o que é melhor e correto não apenas para nós, mas para todos.

Por isso, apesar de ter trabalhado com o tema na época da graduação, percebi que estava um pouco enferrujada para discutir sobre. E nestes tempos atuais, em que vemos a moral religiosa ou a do dinheiro sendo as únicas utilizadas para balizar os comportamentos (e por conta disso, cerceando e limitando a liberdade de quem não concorda), percebo que, mais do que nunca, precisamos falar sobre Ética.

Assim, decidi trazer algumas resenhas de livros que li sobre o assunto para auxiliar a mim em minhas reflexões e atitudes - pois ética é sobre ação mais do que apenas abstração.
O livro em cheque é 'O que é Ética' de Álvaro L. M. Valls. Como todo bom livro sobre filosofia, este também se inicia falando sobre os filósofos gregos, que, para o mundo ocidental são o repositório máximo do conhecimento neste campo. Bem, sobre o que Valls nos apresenta, estas são as notas da leitura que fiz:



Primeiramente, o que seria Ética. Segundo Álvari Valls, "A ética é daquelas coisas qua todo mundo sabe o que são, mas que não são fáceis de explicar, quando alguém pergunta. Tradicionalmente ela é entendida como um estudo ou uma reflexão, científica ou filosófica, e eventualmente até teológica, sobre os costumes ou sobre as ações humanas. Mas também chamamos de ética a própria vida, quando conforme aos costumes considerados corretos. A ética pode ser o estudo das ações ou dos costumes, e pode ser a própria realização de um tipo de comportamento."


Porém, em meu entendimento, Ética trata da liberdade consciente de agir.


Mas vamos a um resumo de pontos do livro sobre ética e sua História desde a Antiguidade:

1) Segundo Valls, os gregos viveram a mais ou menos 2 mil e 500 anos em sua hélade grega (e ele está certo). Porém, não advêm deste período os registros sobre conduta moral mais antigos, porque o Código de Hamurábi existe desde de o século XVIII a.C. E é o código de normatização de comportamento e de ética mais antigo de que se tem registro.

Por meio desta lei da Mesopotâmia, pode-se perceber a necessidade das normas. Bem como, apesar de não existirem registros anteriores a ele, ter uma base de estudo sobre ética a respeito de um período muito anterior ao dos gregos; que, por sinal, beberam de todo o conhecimento sobre ética do Oriente próximo ao Mediterrâneo e da África mediterrânea.

2) O livro trata da ética sempre sob os registros antigos do Ocidente, focando em Grécia e no Império Romano mas sem a percepção de em quê estes povos antigos (mas não tanto) se basearam.

Como Lavoisier disse: "Nada se perde, nada se cria, tudo se transforma". Ora, se o código de Hamurábi foi baseado na lei de talião e, por sua vez a lei dos hebreus do Deuteronômio foi baseada no de Hamurábi, pode-se precisar que a filosofia e a ética das leis grega e romana beberam, e muito, nas leis não-ocidentais.

3) A norma ética da Idade Média e especificamente deste período NA Europa é utilizada como um passo além no fluxo da filosofia da ética, de acordo com o autor. Contudo, novamente, as palavras do autor são contraditórias porque ele mesmo diz que "não são apenas os costumes que variam, mas também os valores que os acompanham, as próprias normas concretas, os próprios ideais, a própria sabedoria, de um povo a outro."

Enquanto na Europa a ética era normatizada pelos dogmas judaico-cristãos do Catolicismo, em outros locais era regida por leis específicas e distintas da primeira. Assim, o livro deveria começar com um prefácio explicando este foco e demonstrando que o estudo do campo da ética AINDA encontra-se em expansão pois não abarca todos "os costumes que variam, (...) os valores que os acompanham, as próprias normas concretas, os próprios ideais, a própria sabedoria, de um povo a outro."

4) "O dever obriga moralmente a consciência moral livre, e a vontade verdadeiramente boa deve agir sempre conforme o dever e por respeito ao dever." A liberdade viria, então, de um senso do fazer o que é correto, porém  apenas surgindo da igualdade entre os seres (livres em si).

A ética estaria acima e para além das leis pois se liga ao pensamento (racional, creio eu) que se forma em uma consciência moral (ética).

5) Ocorre um certo foco da ética ligada apenas a religião ocidental oficial: o judaico-cristã.  O que limita a própria concepção do "o que é ética", pois, apesar de usar de contraponto a religião antiga grega, não vai além disso para falar de ética no Medievo (outro foco reducionista, pois havia florescimento de conhecimento em outras partes do globo terrestre enquanto o continente europeu permanecia focado em penitência e salvação).

6) A moral religiosa foi mais limitadora do que geradora de novas questões que enriquecessem o debate sobre ética. Nisto, acredito, que o livro é um pouco parcial para além do necessário.

7) A citação ao "professor marxista" foi um tanto estranha, visto que o próprio manifesto escrito por Karl Marx vai contra este simplicismo advindo da moral religiosa. Me pareceu pinçado de alguém, no caso o tal professor, com opinião é não argumento válido sobre a questão.

8) Era uma pena que na época em que Álvaro Valls escreveu este livro o trabalho do historiador norte-americano George James ainda não existisse porque ele perceberia que tanto a filosofia grega quanto a moral cristã eram na verdade desdobramento de algo mais antigo.

E para quem interessar, indico o livro: 'Stolen Legacy: The egyptian origins of western philosophy' de George G. M. James.

9) As correntes de pensamentos mais "atuais" que o autor aponta como sendo tendências, na verdade, são as que mais se utilizam hoje para se debater sobre a realidade social atual. Principalmente, a corrente que utiliza o chamado pragmatismo sob o manto do capitalismo.

E neste ponto exato que necessitaria de um capítulo inteiro do livro para mostrar a ética e o que se costuma chamar disso mas que, em um debate sobre, se perceberia que  são argumentos vazios. E este debate, que acredito, faria sentido para a criação desta obra. Pois uniria o conhecimento do passado com os desdobramentos que vemos sobre ética no presente.

10) Um ponto que mostra novamente certa parcialidade, pois não valoriza, o não considera que existem valores éticos, morais advindos de outra culturas - e mesmo do Oriente -, para além dos valores das religiões abraâmicas. E quando o autor explica que "Kierkegaard considerava que uma ética puramente humana, depois do cristianismo, não deixava de ser um retorno ao PAGANISMO, no seio de uma cristandade não mais cristã. A única vantagem que haveria, talvez, para um tal esforço, seria, na perspectiva do homem de fé, a obtenção de uma linguagem comum, aceitável também pelos homens que não possuem a mesma fé. O que, para Kierkegaard, era uma vantagem ainda duvidosa(?)", pode-se indagar:

Uma ética que respeite até mesmo religião não abraâmicas e mesmo o ateísmo seria duvidosa para quem?

Este livro é mais religioso do que marxista, como me disseram que supostamente ele o era.

11) A ética no livro é completamente embasada na visão sobre o assunto sob as obras de pensadores europeus. O que delimita o tema, pois o motivo, por exemplo, de eu aprofundar meu (raso) conhecimento sobre ética, adveio de um livro sobre ética escrito por um monge budista. Provavelmente o tema ética também era caro para outras religiões e povos para além da Europa mesmo na chamada Antiguidade ou no Medieval europeu.

Mas não sabemos como era, porque mesmo os filósofos contemporâneos focam seus estudos apenas sobre os pensadores europeus.

O que é decepcionante.

12) "Assim, hoje em dia, os grandes problemas éticos se encontram nestes três momentos da eticidade (família, sociedade civil e Estado), e uma ética concreta não pode ignorá-los." Valls está corretíssimo em apontar estes três âmbitos.

13) "A liberdade do indivíduo só se completa como liberdade do cidadão de um Estado livre e de direito. As leis, a Constituição, as declarações de direitos, a definição dos poderes, a divisão destes poderes para evitar abusos, e a própria prática das eleições periódicas aparecem hoje como questões éticas fundamentais. Ninguém é livre, numa ditadura; a velha lição de Hegel se confirmou até os nossos dias." Nada mais atual do que este pensamento hegeliana.

Foi uma leitura interessante. Porém, como disse acima, limitadora. No caso, nos primeiros capítulos. Falar sobre ética sem perceber que somos uma sociedade ocidental normatizada por regras que se mantém desde a Idade Média é no minha alienalizante. A ética precisa estar além da religião ou dos costumes de apenas um povo. Porque, ao contrário do que
Kierkegaard pensava, eciste vida pensante para além das religiões. E, mais do que isto, a fé é algo particular. Enquanto a ética deveria ser universal.

Os últimos capítulos deste livro demonstraram um conhecimento brilhante sobre a filosofia e a ética atuais que me fizeram querer aprofundar mais os estudos sobre o tema.

Então, eu recomendo a leitura deste livro pelos capítulos finais. Os outros, vai do conhecimento de cada um sobre História Antiga: se conforme o discurso padrão, porém cheio de lacunas, ou se pela perspectiva dos historiadores atuais que andam rompendo com a História oficial e quebrando paradigmas sobre temas como filosofia.

E não paremos aqui. 

Até a próxima!

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